Tinha um novo rosto, um novo nome, e estava no lugar que sempre sonhei. Enquanto passeava por aquelas ruas, com a neve tocando a minha pele e o frio fazendo estremecer o meu corpo, me aconcheguei naquele casaco na tentativa de me aquecer. A escuridão da noite era apaziguada pelas tímidas luzes que vinham das casas que passo a passo eu deixaria para trás. Assustei-me quando de súbito ouvi uma voz em desespero. Não percebi que alguém se aproximava, pois os passos apressados foram abafados pela neve. “Por favor, me socorra, eles me prenderam em um cativeiro!”, ela me suplicava quase sem fôlego. Você se lembra do dia em que nos conhecemos?
As coisas no Fake eram assim, aconteciam de forma simples e inesperada. Era um mundo amplo, aberto, um espaço que nos permitia ser quem gostaríamos de ser, ou simplesmente curtir por um momento à fuga da realidade. Depois de bancar a sua heroína, fiz o pedido que uniu nosso destino: “Quer ser minha melhor amiga? ” Não fazia o menor sentido, mas fácil assim, você aceitou. Desde então vivemos várias aventuras, interpretamos vários personagens. Como aquela frase do George Martin que diz que “um leitor vive mil vidas antes de morrer, o homem que nunca lê vive apenas uma”, íamos construindo as nossas histórias juntas. Irmãs, amigas e rivais. Até que um dia, a amizade nascida e ambientada em um espaço virtual, migrou para a realidade.
Como algo que surgiu no Fake poderia se tornar tão real? Ao vestir uma máscara eu pude te mostrar meu verdadeiro eu, e por isso nos demos tão bem. Então eu me vesti de mim mesma e pude ver sua verdadeira face. E apesar de tudo isso, soubemos nos adaptar às mudanças uma da outra. Nem mesmo os km que separavam a cearense da garota mineira seriam o suficiente para romper o laço que se formou.
Um dia te falei que o principal de uma amizade é a sinceridade, e por isso nosso relacionamento era como um livro aberto. Você era o diário ambulante que guardava minhas recordações, pois não existia nada sobre mim que você não soubesse. Me conhecia tão bem que acho que nem eu poderia dizer quem sou como você seria capaz. Até que um dia as omissões, as diferenças e a correria do dia a dia, nos fizeram ceder. Quem diria que a distância que nos separou não seria a do espaço geográfico? O tempo nos fez tão diferentes.
E eu que prometi estar com você te apoiando em tudo, me tornei tão fraca e incapaz. E de todos os depoimentos que fizemos uma a outra, baseado naquele mangá, Nana, que você me apresentou, jamais imaginaria que o final seria igualmente trágico. “Eu não fui capaz de te aceitar porque eu era vazia como um copo barato”. A verdade que eu nunca te disse, é que meu maior medo era que você não me aceitasse. O ser humano é frágil, se quebra facilmente.
Eu me vi cada vez mais parecida com a personagem do Nana que você disse ter sido inspirado na gente, quando a Hachi no seu monólogo fala: “Sabe, Nana, nós passávamos tanto tempo juntas... Mas hoje, eu percebo que não sabia nada sobre você. Sequer fui capaz de perceber que estava te ferindo. Me perdoa?” A promessa que eu te fiz ainda é válida. Vou te esperar mesmo que o futuro seja diferente de agora. E a chave do apartamento 707 vai estar no lugar de sempre.


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